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segunda-feira, julho 28, 2008

CLOSET



17



- Então, para onde eu te levo?
- Prum café. Tô com fome.
- É mesmo. Comida da prisão deve ser horrível.
- Tudo é verde, menos a salada.

Param num café, pedem croissants.

- Vou te contar uma coisa.
- Conta.
- É a segunda vez que vou presa por atentado ao pudor.
- Reincidente?
- Pois é.
- Por causa dos sonhos?
- Não, os sonhos são recentes.
- O que foi da outra vez então?

Melissa lembra do ciúme de Ali. Se arrepende de der tocado no assunto.

- Ah, já faz tempo.
- E foi por que?
- Eu tava beijando minha namorada da época na rua.

Ali larga o croissant e respira fundo. Se controla.

- Faz décadas que isso não é mais considerado ilegal.
- A gente tava em cima de uma estátua.
- ...
- E minha blusa tava levantada.

Depois de alguns segundos.

- Que tipo de tara é essa?
- Eu sei, parece que eu sou louca, mas não, viu?
- E por que em cima da estátua?
- A gente subiu de brincadeira e... Sei lá. Rolou.
- E você quer alegar que isso é normal?
- Ei, se liga, há 20 minutos a gente tava se beijando num estacionamento público, essas coisas acontecem.

Agora além de estar com ciúme Ali está irritada de ter que concordar. Melhor ficar quieta.

- Ali.
- ...
- Ali, fala comigo?
- Falar o que?
- Não sei. Mas eu tô perdida aqui.
- ...
- Aquilo foi outra brincadeira?
- ...
- Amanhã você vai me mandar outro e-mail dizendo que foi engano e que eu não entendi nada?
- Vou dizer que foi um dos seus sonhos.
- Você disse que eu tava acordada antes.
- Eu disse isso dentro do sonho.

Melissa levanta e vai embora sacudindo as mangas muito compridas da camisa emprestada.

Trinta e quatro segundos depois ela volta.

- Isso é ridículo.
- O que?
- Esse lesbian drama. E você nem é lésbica!
- O que é um lesbian drama?
- Tá vendo? A culpa é minha, sou eu que tô provocando. Ali, você me faria um favor?
- Qual?
- Me interna?
- Acho que não, eu gosto de te ver andando pelo escritório. Será que você iria trabalhar pelada um dia desses, se eu pedisse?
- Eu tô falando sério.
- Claro que tá.
- Você não pode ficar me beijando assim.
- Eu não beijei sozinha.
- Por isso mesmo.

Ali levanta a sobrancelha.

- Perdi o fio da meada.
- Eu tenho sentimentos. E você é casada.
- E você tem a...
- Não tenho ninguém.
- Mas e a...
- Eu nem conheço! Tava só tentando me interessar por alguém gay e solteiro.
- Por que?
- Por que talvez você não tenha descoberto ainda mas gays também gostam da perspectiva de namorar, casar, ter relações exclusivas e afetivas.
- E você quer casar comigo?
- Por enquanto não.
- E depois?
- Depois do que?
- Depois que eu largar meu marido.
- Você não vai fazer isso.
- Por que não?
- Por que sim?

Melissa olha pra dentro da xícara. Está ao mesmo tempo tentandos fazer Ali entender que isso não dá em nada e arrancar dela uma declaração de amor eterno. Se sente mais perdida e sozinha do que nunca.

Ali coloca um guardanapo sobre a caneca de café que tanto atrai o olhar de Melissa. No guardanapo está escrito "Vamos pra sua casa?"

- Não.
- Por que?
- Porque eu não tenho casa.
- Como não?
- Eu moro num carro.
- Que?
- Você ouviu.
- Num carro?
- É.
- Tipo um automóvel?
- É.
- ...
- ...
- E onde você faz xixi, toma banho, essas coisas?
- Fico num camping.
- Sozinha?
- Não, eu moro com uma família romena de 7 pessoas.
- Sério?
- Claro que não! Claro que eu moro sozinha!
- Ué, quem mora num carro é capaz de tudo.
- Mas eu sou normal.
- Eu é que sou estranha, casada com um cara e apaixonada por uma colega de trabalho.

o estômago de Melissa dá um nó de ouvir aquela palavra. Apaixonada. Todo o sangue do corpo vai pro rosto. E Ali continua.

- Eu queria beijar você mais.

Agora o sangue desce. Lateja. Ali não desiste.

- No seu carro ou no meu?


xxx

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