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terça-feira, setembro 09, 2008

CLOSET


35



Isso é insuportável. Ela desiste. Pega a direita no corredor e anda decidida e puta, cada passo cobrindo um metro e vinte. Nem precisa ignorar a secretária porque a secretária mesmo a ignora. Entra na sala da Presidência. Glen e Roberta estão lá esperando que ela diga alguma coisa.

- Eu me demito.

Ninguém fala nada por 27 segundos, Melissa está com o cronômetro na cabeça. Sem se mexer, Glen fala.

- Ganhei.

Roberta tira uma nota de $50 do bolso e lhe entrega. Melissa não acredita. Larga um sorriso entre o amargo e o sarcástico e vai embora. Nem pega seus objetos pessoais, não quer nada que lembre desse período da sua vida.

Desde o começo ela sabia que ia dar merda. Era óbvio. Naquele primeiro tour pela empresa com Ali já sentiu que essa história tinha tudo pra dar errado. Mesmo assim, ficou. Por que? Ela pára numa esquina desconhecida, cercada de pessoas desconhecidas, oferecendo quatro caminhos diferentes, igualmente desconhecidos.

Ela ficou só pra ter para aonde ir.

***

Melissa deve ter andado umas cinco horas sem destino. A meia-calça estava furada num dos joelhos e tinha perdido um pé do sapato. Já era noite e ela não tinha a menor idéia de onde estava. Era um bairro movimentado, cheio de neons e um comércio suspeito de comida, eletrônicos e jóias. Um toque no braço faz ela parar. É um homem enorme de terno preto. Ele tem cara de estrangeiro mas ela também tem.

- Entra aqui moça, eu dou um desconto.

Aqui, ela espia, é uma porta roxa logo atrás dele. Não dá pra ver o que tem lá dentro. Mas como ele fora a primeira pessoa em sete dias a lhe dirigir a palavra, ela aceita o convite quase chorando de emoção.

O homem de preto chama outro e os dois discutem alguma coisa em uma língua que ela não entende tirando as palavras dólar e Renée. O segundo homem a leva pra dentro, indica uma cadeira e entrega um cardápio de bebidas.

- Vodca com limão.
- E vai querer gorjetas?
- Como?
- Gorjetas. Vai querer comprar quanto?

Ela não entende do que ele está falando.

- Ok, começa com dez, se quiser mais me chama.

Ele entrega dez notas falsas de dinheiro, plastificadas. A mesa fica a sua esquerda, na frente um tipo de palco, tão perto que dá pra apoiar os pés nele. Um sistema de som toca uma dance music do inferno. A vodca chega. É provavelmente a mais horrível que já tomara na vida, mas não se intimida e já pede a segunda. A luz do bar apaga, a do palco fica acesa. Showtime.

Um poste metálico desce e uma mulher fantasma entra com uma flanela e uma garrafa de desinfetante. Ela limpa o poste como se ninguém estivesse vendo, coloca o produto num canto e com a mesma expressão de aborrecimento se joga de perna aberta, gira no pole e fica de cabeça pra baixo.

Melissa não decide se "que bom que alguém falou comigo hoje" ou se "claro, só o porteiro de um club de strip tease falaria comigo hoje".

A garota de saco cheio se contorce acrobática pelo palquinho desinfetado. Os outros expectadores são todos homens. Melissa pensa se eles percebem que a dançarina está entediada. Se eles se eternecem com o fato dela trazer seu paninho e seu desinfetante e tirar os primeiros 30 segundos do seu número pra cuidar de si. Não.

Da metade da música em diante ela vai pro chão e rasteja coreograficamente de mesa em mesa recolhendo gorjetas - as notas falsas que ela recebe e coloca dentro da tanga. Melissa descobre que é por isso que as notas são plastificadas, tem um ataque de nojo e larga as suas imediatamente. A striper recolhe e agradece.

- Posso te oferecer uma lap dance?

Mel ganhou o direito com as dez gorjetas.

- Não, obrigada, não precisa.

Ela não sabe se a moça se sentiu rejeitada ou aliviada ou se não sentiu nada. Provavelmente nada. Não fazia diferença mesmo. Trabalho é trabalho. Ela dança como quem preenche uma planilha de Excel.

Pede mais bebida, uma para cada show. Oito garotas já passaram pelo seu copo quando o DJ anuncia Renée.

A música que começa a tocar já é estranha. Nunca tinha visto alguém tirar a roupa ao som de Blonde Redhead.

Renée entra no palco sem produtos de limpeza e isso deixa Melissa um pouco apreensiva. Mas ela repara, Renée não toca no poste. Dança solta, cheia de curvas, atlética e suave. Deixa a roupa escorregar. Tira só uma parte, pede a alguém que puxe o resto, a manga, a barra da saia, o scarpin vermelho.

Só que debaixo da roupa está outra roupa. Uma camisa, uma gravata, um colete, uma cueca, um volume. E assim ela senta no chão com as pernas abertas, as pernas peludas, a cara completamente diferente, de homem.

Who else is new I want to believe the way you do I still cant see
Love love love love thats all it is try my lines try my tricks
Why be artistic look at me to be linguistic to be domestic
Let me imagine this lasting blasting falling twisting I will be
There and we will dares

Vai para a beira do palco ostentando a si mesma como um galo e afrouxando a gravata, abrindo cada botão, continua o strip como se nada de diferente estivesse acontecendo, tivesse acontecido.

Depois tira a cueca e um vulto está lá, imponente, mas era de verdade ou amarrado? A luz apaga. Centenas de dólares plastificados voam pro centro do palco no escuro. Melissa procura o garçon desesperada, entrega a ele todo o seu dinheiro pra transformar em plástico e jogar em Renée, a luz acende bem na hora em que está arremessando, Renée sorri.

- É muito.
- Não é não.
- Então posso pelo menos te pagar um drink?
- Pode.
- Ok, mas não aqui, esse lugar é nojento. Me encontra lá fora em dez minutos.

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