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sexta-feira, setembro 19, 2008

CLOSET

36

Renée e Melissa estão sentadas na mesa de um boteco. Mel pediu uma Coca, mas o garçon trouxe duas cervejas e quatro cachaças.

- Então você gostou do show?
- Gostei.
- Por que?
- Não sei. Foi diferente do que esperava.
- Ah.
- Por que?
- Por que o que?
- Masculino e feminino.
- Por que não?
- Ah, não é o que os homens esperam.
- E por que ser o que os homens esperam?
- Sei lá. Pra ganhar dinheiro.
- Sabe, a minha profissão é uma das poucas no mundo onde eu posso fazer o que eu quero e não o que os homens esperam pra ganhar dinheiro.
- Mas você é uma stripper.
- Pois é.
- Você tem que fazer o que os homens esperam.
- Você acha que eu faço?
- Não.
- Você acha que eu ganho dinheiro?

Pelo que Melissa viu na chuva de gorjetas, Renée ganhou em meia hora mais que ela em um mês.

- Mas como?
- Como o que?
- Se você fizesse o show só de mulher não ganharia mais?
- Não. Eu não sou particularmente interessante, ninguém pagaria muito pra me ver tirar a roupa.
- Então só de homem?
- Aí ninguém teria a permissão social pra me dar gorjetas.
- Então você usa a transformação?
- Não é uma transformação, transformação é roupa e maquiagem, qualquer um pode fazer. Eu sou os dois.
- Como assim?
- Você não me vê fazer maquiagem, colocar barba, tirar peito, colocar peito, virar homem ou mulher. São apenas dois estados. Eu sou homem e mulher.
- E?
- Não existe distorção. Eu estou além da orientação sexual, sem deixar o terreno da sexualidade. Sexo excita, não gênero. É uma coisa libertadora, instintiva, primal e muito sufocada isso que eles sentem. Mas eu tenho as permissões. É o nosso segredinho.
- Minissaia é uma permissão?
- Minissaia é a chave da carteira. Mas o resto é que provoca a generosidade. O que eu ofereço é o reconhecimento de dois sentimentos intrinsicamente humanos.
- Quais?
- Inveja e domínio.
- E o que isso tem a ver com o strip tease?
- Como assim o que tem a ver? Absolutamente tudo.

Melissa vê sentido mas não agora. Muito álcool e ainda chegam mais quatro cachaças.

- Qual sua profissão, Melissa?
- Advogada.
- Você sim faz o que os homens esperam pra ganhar dinheiro.
- Eu trabalho numa empresa que só tem mulheres.
- E?

Pois é. E? Ela lembra da sala Amelia Truewoman, dos treinamentos, e tudo parece muito mais obsceno do que tirar a roupa em público. Melissa era uma prostituta.

- Onde você trabalha?
- Na Closet & Closet Associados.
- Ah!
- Já ouviu falar?
- Já trabalhei lá.
- Já?
- Sim, eu sou advogada por formação. Trabalhei lá por um ano. Foi o que me fez virar stripper.
- Nossa, é demente aquele lugar não é?
- Foi um dos lugares onde eu mais aprendi na vida.

Tudo é muito confuso, a cerveja, a cachaça, aquele buteco, aquelas moscas, a resposta é uma nuvem. Mas no fundo, a noite inteira, só tem uma pergunta que intriga Melissa.

- Renée, no final do show.
- Hm.
- Tem um vulto.
- Um pênis.
- É seu?
- Lógico.

Melissa acha que fez a pergunta errada.

- Naturalmente?
- Ele é meu, Melissa.
- Não, mas você é homem ou mulher?
- E o que um pênis tem a ver com isso?

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